Lilás já não tinha nenhum parente próximo. O mais próximo de um parente que ela tinha era a Dona Regina, uma senhorinha linda. Lilás adorava ela e por vezes passava tardes inteiras conversando, ou lendo com ela.
Regina era uma comuna invicta com todos os argumentos vermelhos que uma boa comuna deve ter. Ela tinha tido uma vida imensa, falava horas sobre tudo o que já tinha feito na vida, e ela realmente já tinha feitos coisas incríveis, só não contava como havia chegado alí e Lilás não tinha coragem de perguntar.
As visitas que Lilás fazia a casa dela aconteciam sempre da mesma forma. Regina sempre parava na porta e dava uma volta, pedia um segundo, ia até a radiola, colocava o mesmo disco da Billie e cantava ... me, myself and I...ela cantava sorrindo e dançava a doçura que aquela música despertava nela. Em seguida começava a tocar “Georgia on my mind” e Regina se portava de acordo com a música, sentava, com uma tristeza elegante, e acendia um cigarro.
Lilás adorava isso e só entrava em cena quando Regina perguntava: - me acompanha? E enchia o copo de bourbon até a boca, acabando com a elegância e soltando uma longa risada.
A tarde corria com discussões sobre poesia, música e política. Regina era uma senhora desbocadíssima e por vezes corria pra janela e gritava : “ Homens de terno, prestem atenção na diferença entre uma prisão de ventre e uma saída bloqueada... colocaram no seus cus mas vocês nem se deram conta. Isso aconteceu na mesma hora em que vocês estavam tentando colocar no cu de outrem. Marrons! vocês são todos uns marrons!
E completava só para Lilás... “ marron é uma cor tão sem graça, chega a me dar náuseas”... Corria para o banheiro, vomitava e dormia.
Lilás ia embora para casa um tanto atormentada pela bebida, no caminho ela ia pensando sobre qual seria o intrigante caminho que levou Regina àquela vida, se perguntava ainda se não estaria próxima demais do percursso feito por ela e se no caso ela teria condições de viver tão plenamente como vivia Regina. Lilás chorava ao pensar nisso e falava sozinha com o intuito de se aproximar tanto do ridículo ao ponto de não ter mais medo dele. Ela chorava e sorria para desconhecidos pensando qual seria a música que ela cantaria com saudade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário